“O dinheiro, concluiu Burlap, era a raiz
de todo o mal; a fatal necessidade, sob a qual o homem agora trabalha, de viver
em função do dinheiro e não das coisas reais. ‘Aos olhos modernos os ideais de
São Francisco parecem fantásticos, supinamente insanos. A Senhora Pobreza foi
rebaixada pelas circunstâncias modernas até a semelhança duma jornaleira de
sapatos furados que usa avental de estopa... Nenhum homem sensato sonharia com
segui-la. Idealizar uma Dulcineia tão repulsiva seria mostrar-se mais louco do
que o próprio Dom Quixote. Dentro da nossa sociedade moderna o ideal
franciscano é impraticável. Tornamos a pobreza detestável. Mas isto não
significa que possamos simplesmente desdenhar São Francisco como se ele fosse
um visionador de sonhos loucos. Não. Pelo contrário, a insânia é nossa e não
dele. Ele é o médico no manicômio. Para os lunáticos o médico parece ser o
único louco. Quando recobrarmos a razão, haveremos de compreender que ele era o
único homem são. Nas condições atuais o ideal franciscano é inexequível. A
moral disso é que as condições devem ser alteradas, radicalmente. Nosso alvo
deve ser criar uma nova sociedade na qual a Senhora Pobreza seja, não a sórdida
jornaleira, mas sim uma forma esplêndida de luz, de graça e de beleza. Oh, Pobreza,
Pobreza, linda Senhora Pobreza’...”
(“Contraponto”, Aldous Huxley, Círculo do
Livro S.A., São Paulo, 1973, Página 246.)
Nenhum comentário:
Postar um comentário